O Problema do Spam Telefônico no Brasil

Como Funciona a Estratégia:

Chamadas-Teste: Ligações curtas (2-3 segundos) e mudas não são erros, mas sim "robôs discadores" testando se um número está ativo. Quem atende tem seu número validado e vendido para listas de "leads" valiosas.

Dados Vazados: O mega vazamento de dados de 223 milhões de brasileiros em 2021 forneceu informações detalhadas (CPF, endereço, score de crédito, etc.) que permitem golpes personalizados.

Golpes Sofisticados: Os criminosos usam esses dados para aplicar golpes convincentes, como:

Empréstimos Falsos: Oferecem crédito fácil, mas exigem um depósito que desaparece.

Fraudes Bancárias: Se passam pelo banco com informações reais da vítima para ganhar confiança e roubar dados ou a conta. Em alguns casos, um motoboy vai até a casa da vítima para recolher o cartão.

A Ineficácia do Sistema de Proteção (e o Papel da Anatel):

"Não Me Perturbe" é Ineficaz: O sistema é administrado pelas próprias operadoras (Claro, Vivo, Tim, Oi) e só bloqueia ligações diretas delas e de bancos. Empresas terceirizadas, call centers e CNPJs "laranja" escapam do bloqueio.

Fiscalização Fraca e Multas Insuficientes: A Anatel aplica multas (R$ 32 milhões entre 2022-2025) que são consideradas baixas perto do volume de bilhões de ligações fraudulentas.

Flexibilização das Regras: Em 2025, a Anatel revogou a obrigatoriedade do prefixo 03, que identificava ligações de telemarketing, dificultando que o consumidor saiba se deve atender ou não. Essa decisão foi criticada por ProCons e pelo IDEC como um retrocesso.

O Mercado Bilionário por Trás das Ligações:

Modelo de Negócio Lucrativo: O setor de telemarketing movimenta bilhões por ano. O modelo é baseado em escala: custo por ligação é baixo e, se uma em mil ou dez mil der certo (seja uma venda ou um golpe), o lucro compensa.

Infraestrutura Cinza: Operam empresas de fachada (CNPJs laranja) que usam tecnologias como Voip e máscara de número. Quando são bloqueadas, desaparecem e ressurgem no dia seguinte com nova identidade.

Cumplicidade e Omissão: As operadoras lucram fornecendo a infraestrutura (linhas, pacotes de disparo) e administrando o sistema de bloqueio, criando um conflito de interesses. A regulação é lenta e não acompanha o ritmo do problema.

Conclusão:

O spam telefônico não é um caos, mas um sistema eficiente e lucrativo que se sustenta pela omissão regulatória, pela baixa efetividade das punições e por um modelo de negócio que trata o cidadão como um insumo. Enquanto for lucrativo para as operadoras e para as empresas de telemarketing, e enquanto a fiscalização for fraca, o ciclo de abuso continuará.